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Conhecer a História para
Entender nosso Tempo

 

(resumo de palestra que o autor - renomado escritor de livros
didáticos da Editora Saraiva - tem proferido para professores
de 1
0 e 20 graus nos mais diversos pontos do país)

 

Elian Alabi Lucci

 

     Com o desenvolvimento acelerado do processo de globalização entramos na era do conhecimento e da criatividade. Essa passagem para a "sociedade do conhecimento" (para usar a expressão de Peter Drucker) deve colocar a pessoa no centro do mundo. E a sociedade do conhecimento precisa ter em seu âmago a educação da pessoa. Uma educação que aponta para a universalidade, exatamente porque a sociedade do conhecimento é uma sociedade de conhecimentos e é global - não só em sua moeda e em sua economia, mas em suas carreiras, em sua tecnologia, em suas questões básicas e, acima de tudo, em seus conhecimentos.

     Assim a sociedade pós-capitalista, a sociedade do conhecimento necessita precisamente do oposto daquilo que é, afinal, propugnado por desconstrucionistas, pelas feministas radicais ou pelos anti-ocidentais. Ela precisa daquilo que eles rejeitam: uma pessoa educada para o universal.

     A sociedade pós-capitalista necessita dessa educação aberta mais do que qualquer sociedade anterior e, nesse quadro, o acesso à grande herança do passado é um elemento essencial.

     Segundo Peter Kreef, "Nosso mundo é um mundo sem heróis". Um país sem heróis - claro que não se trata aqui só (nem principalmente...) de heróis de armas, mas de todo tipo de heróis (aí incluídos os protagonistas do quotidiano) -, sem memória é um triste país.

     Mas como manter a memória nacional? É exatamente através do estudo de sua História, do seu passado, de seus heróis, de seus comportamentos em determinadas situações.

     Regine Pernoud, ao lembrar que o homem é também um animal histórico, indaga-se: "Mas como é possível interessar-se pela história na época em que os homens andam sobre a lua?". A resposta é simples, qual foi o primeiro ato realizado pelo homem quando se viu na Lua? Abaixar-se para apanhar uma pedra. O gesto ancestral. Para além de todas as definições, história é vida e o homem se define pela sua história: se uma pedra pode ter tanto interesse para ele, é porque ela é "signo da vida". A História é a busca do vivido, esse vivido através do qual traçamos nossa própria existência.

     Por que é preciso conhecer a História do mundo e de seu país, das tradições sociais, culturais e políticas de um povo? Para que não sejamos levados - como é muito comum hoje em dia - a pensar com a cabeça alheia; e trata-se de conduzir e não de sermos conduzidos. Chesterton, diz que o homem não é verdadeiramente um homem enquanto não vê o mundo de pernas para o ar e de cabeça para baixo. Pode-se praticar esse exercício sem muita fadiga, estudando História.

     Ao se familiarizar com outros tempos, outras épocas, outras civilizações, adquire-se o salutar hábito de desconfiar dos critérios de seu tempo: eles evoluirão, como outros evoluíram. É a ocasião de revisar, dentro de si próprio, o mecanismo de pensamento, suas próprias motivações etc. por confronto com o outro.

     O estudo da História permite também avaliar melhor a noção de progresso. Geralmente nós fazemos uma idéia muito elementar do progresso.

     Lewis Mumford, escreve que somos levados a pensar que se as ruas de nossa cidade eram sujas no século XIX, elas deveriam estar quinhentas vezes mais sujas seiscentos anos antes. Quantos estudantes acreditam piamente que o que aconteceu no século XIX, por exemplo, o trabalho das crianças nas fábricas, sempre existiu e que só as lutas de classe e o sindicalismo, no final do século XIX, liberaram a humanidade desta situação! Quando se tem uma educação histórica, o progresso (em geral) é uma clara evidência, mas também o é o fato de que não se trata jamais de progresso contínuo e uniforme. Na verdade, a humanidade avança em certos pontos, recua em outros: o impacto em nós produzido pela constatação de tal avanço deve ser o mesmo que ante a constatação de um retrocesso...

     A História não fornece soluções, mas permite enquadrar corretamente os problemas. Ora, todos nós sabemos que um problema corretamente proposto já está meio resolvido.

     Negligenciando a formação do sentido histórico, esquecendo que a História é a memória dos povos, o ensino forma desmemoriados. É relativamente freqüente o lamento de que nas universidades contemporâneas estejamos formando irresponsáveis, valorizando a fria formação técnica em detrimento da sensibilidade e do caráter. E, nesse quadro, deve-se observar que é grave também formar desmemoriados. Tanto quanto o irresponsável, o desmemoriado não é uma pessoa completa, nem um nem outro desfrutam do pleno exercício das suas faculdades, que é a única coisa que permite ao homem, sem perigo para ele e para os seus semelhantes, o exercício de uma verdadeira liberdade.

 

Ensino e Metodologia Crítica

     As Ciências Sociais em nosso País passaram historicamente, dos anos 50 até aproximadamente 1970, por um processo de ensino voltado para a pesquisa empírica (experiência e observação), sem nenhum apoio teórico para os assuntos abordados.

     A partir de 70, surgiu uma tendência - igualmente exagerada - a de descarregar no aluno as mais diversas informações estrututradas por modelos de análise, freqüentemente distantes de nossa realidade social.

     Tanto uma como outra abordagem metodológica, não dá ao aluno condições para estabelecer relações entre a teoria e a prática. Assim elas contribuem para que as análises metodológicas se caracterizem ainda hoje pelo conservadorismo.

     As diferentes Ciências Sociais (Antropologia, Geografia, Sociologia, Política...) da maneira como são ensinadas, distanciam o aluno da realidade e dos problemas da sociedade. A realidade social, devido a complexidade da nossa sociedade, exige no seu estudo, uma ação conjugada - e não compartimentada - das Ciências Sociais. E o que ocorre é que outros contextos - para além do particular enfoque da ciência em questão - tendem a ser desconsiderados.

     Assim, em Geografia, ao priorizarmos "modelos" que não consideram o contexto histórico e social não permitimos ao aluno ultrapassar o nível superficial das nações que são estudadas. Uma metodologia crítica deve procurar dar ao aluno amplo contato com a realidade que o cerca. Para isto é importante que o aluno tenha consciência de sua dimensão espaço-temporal, para que possa questionar os processos de mudança social: ele deve ter consciência do processo que está vivendo, por exemplo: o significado e o alcance de estarmos situados na América Latina.

     Outra necessidade na abordagem crítica das Ciências Sociais implica em que os principais acontecimentos sociais, econômicos, políticos e culturais do problema a ser estudado sejam tratados em unidade (por exemplo: A guerra do Contestado - ou a de Canudos - não podem ser compreendidas sem a análise do condicionamento dado pelo ambiente geográfico, tanto quanto pelo o contexto social em que ocorreram).

     Para tanto é necessária a interdisciplinariedade, para que não se promova um conhecimento parcial e fragmentado do real. Concluindo, todo ser humano para produzir conhecimento, deve ser crítico, questionador e ter uma postura metodológica cujas técnicas de investigação sejam coerentes com a visão do mundo.