Home | Novidades | Revistas | Nossos Livros | Links Amigos Educação: Pluralidade, Ética e Competência na Formação Profissionalizante Continuada
dos Educadores
Mônica Heloisa Braga Vasques*
Fabíola Cristina M. Caovilla Palipério**
Educação e Formação dos Professores
Diante das crises evidentes que o mundo moderno vem demonstrando neste início de século, em todos os âmbitos do saber e do fazer humanos, notadamente no da Educação atingindo conceitos de autonomia, emancipação e liberdade, cumpre-nos, mais uma vez, repensarmos e refletirmos sobre as novas competências para ensinar, novos entendimentos sobre ensinar e aprender,aprender a aprender e como apreender as novas formas de relação entre a ética e o agir pedagógico.
Isto deve ocorrer para que possamos compreender e ensinar a pensar sobre os problemas existentes, diante da pluralidade dos diferentes contextos culturais de uma sociedade que altera profundamente seus processos de socialização e de formação de identidade.
Assim, para Hermann (2001:90), “embora a sociedade imprima a Educação um caráter de constante mutação, como incontrolável, nós não devemos entender este processo como de desorientação”. E é neste contexto que se torna impossível se sustentar um modelo ideal de Educação e, muito menos, de se continuar com a aplicação das tradicionais práticas pedagógicas.
Para tanto, a pluralidade dos contextos sociais impelem à multiplicidade e ao reconhecimento de um mundo plural que exige do ato de “Educar” novos moldes e técnicas, que se renovam, e constantemente, renovam os objetivos da Educação.
E é, portanto, dentro desta conotação da realidade que se insere este nosso estudo, despretensioso e em nada inovador, frente aos já publicados neste campo, mas que pode servir de base, auxílio e ponto de partida para momentos de reflexão, quando se pensa nos novos papéis da Escola e de seus Educadores, principalmente sobre a ótica profissional e profissionalizante, na busca de aperfeiçoamento, aprimoramento ou desenvolvimento de novas potencialidades, para uma escola competente, dentro das novas exigências impostas pela cultura plural, heterogênea, ética e facilitadora da cidadania.
Assim, como pudemos constatar, os professores foram desenvolvendo, pelo seu papel em diferentes ocasiões, várias conotações: a do crente, do mágico, do palhaço, do vendedor de ilusões, do salvador da pátria, do mito, do pesquisador, do cientista, do padre, do pastor, do mestre, do artista e do artesão, quer pelo seu saber acumulado, no passado, pelo preparo científico, quer pela improvisação na resolução de problemas, como no manuseio das práticas pedagógicas, hoje em evidente crise de desprestígio.
Desta forma, fomos em busca de uma educação e de educadores que trabalham realmente para a construção de uma sociedade mais digna, mais feliz, mais respeitável, contribuindo, para que os educandos consigam ter uma vida melhor, que leve ao sucesso, com qualidade, criando sensibilidades que se impõem como novas temáticas para a educação. Daí a educação inter e multicultural, de gênero, para a paz, a ambiental, entre outras, que chegaram para ampliar nossos horizontes de compreensão.
Assim, neste novo contexto de Educação entendemos a formação continuada dos professores como uma necessidade imperiosa que se impõe, a cada dia, seja pelos mecanismos públicos e gratuitos, seja pela busca incansável de recursos diferenciados, individuais e autônomos, ou promovidos por instituições, agremiações, sindicatos, mas de qualquer forma, sempre consciente, critica, reflexiva, interativa e plural, através da pedagogia das competências, sejam pela autonomia ou pela adaptação da interação entre os três sujeitos: o eu individual, o eu pessoal e o eu social. Segundo Nogueira (2002), é o que vem acontecendo no Chile, Argentina, Brasil e em quase toda a América Latina, como também na França, Espanha, Portugal e Austrália.
Modelos tradicionais de ensino
A necessidade da efetiva reformulação dos modelos tradicionais de formação docente, de forma continuada, tem servido como meio para se chegar a uma educação e aos seus profissionais competentes, e esta idéia cresce dia-a-dia, não só no Brasil, como em todo mundo, não apenas entre pesquisadores e acadêmicos, como também está presente na definição de políticas que afetam os sistemas de profissionalização.
Segundo Imbérnon (2004:9), diante das mudanças adotadas pela comunidade social, no conhecimento científico; nas formas de pensar, sentir e agir das novas gerações; nos meios de comunicação e da tecnologia; nas transformações da vida institucional em relação à transmissão do conhecimento; na análise da Educação que deixa de ser patrimônio exclusivo dos docentes e na presença de modelos relacionais e participativos na prática educacional, surge “uma nova forma de ver a instituição escolar, as novas funções do professor, uma nova cultura profissional e mudança no posicionamento de todos os que trabalham na educação”.
Assim, só podemos pensar em mudança da prática docente se reformularmos a atuação junto aos professores e, para tal, a preparação profissional inicial ou continuada, constituem grande estratégia de profissionalização do professor, desenvolvendo-lhe competências necessárias para atuar no novo cenário, posto que a maior parte das reformas educacionais que vêm sendo adotadas, contemplam a formação inicial dos professores, as medidas de aperfeiçoamento, os debates, a capacitação em serviço, embora somente estas medidas não sejam suficientes para atender e abranger amplamente a questão.
Com base em estudos recentes, buscamos com este artigo contribuir e enriquecer sobre esta premência emergencial no que diz respeito a políticas educacionais que rompam com a forma tradicional de ensino, ensejando melhores caminhos para o campo educacional e que seus profissionais atinjam, na crescente busca, a satisfação pessoal, social e profissional, através de propostas pedagógicas alternativas que efetivem a sociedade democrática e solidária, tão almejada “por um sistema aberto, no qual intervenham variáveis organizacionais quanto de personalidade e interpessoais”.
Como afirma Ramos: “posto que a essência humana é aquela desenvolvida pelo homem na sua história social e não transcendentes, organizando uma escola não apenas ativa, como também criadora”. Ramos (2002; 298).
Conhecimento Profissional do Professor
Segundo Imbérnom, (2004) os professores possuem um amplo corpo de conhecimentos e habilidades especializadas que adquirem durante um prolongado período de formação.
O conhecimento pedagógico é construído e ampliado ao longo do tempo pelos profissionais da educação, durante sua vida profissional, como resultado das relações entre teoria e prática, ao passo que o conhecimento da disciplina requer mais técnica, focado nos procedimentos de transmissão. Já a competência profissional é fruto de todo processo educativo, mais a interação entre os professores e o exercício da profissão, com seus próprios alunos.
Para as próximas décadas, a tendência deverá continuar a ser a formuladora de uma sociedade em mudança, com sensível desenvolvimento tecnológico e sensível elevação do conhecimento.
Conseqüentemente, a reformulação dos modelos de formação docente não deve mais ser vista e sentida como necessidade, mas como urgência ou emergência, para o professor, posto que o professor acadêmico e tecnicista, transmissor de conhecimentos, faz parte de um arquivo do passado.
Atualmente, a expectativa que se tem do papel do professor, é a de que ele intervenha, de forma ativa e reformule sua prática através de avaliações e estratégias diferenciadas, para, com métodos alternativos, atingir a urgente alteridade, com autonomia e participação, consciente e responsável.
Daí resulta a reformulação de sua capacitação profissional para criar um profissional facilitador da aprendizagem, prático reflexivo,envolvendo nesse processo educativo, não só o seu conhecimento como as novas necessidades dos alunos e as ansiedades dos familiares, atingindo metas pessoais, profissionais, institucionais e sociais. Ele se organiza e auxilia na organização educativa.
Este é, pois, o momento de se refletir sobre a necessidade de se continuar a investir em educação, na formação inicial, ao longo de sua vida profissional, de forma contínua, efetiva e eficiente, para que a sociedade colha os frutos através da ação social de seus professores e alunos, como um produto final reerguendo valores de pátria, nação, tornando-a mais humana e humanizadora, com modelos de vida mais digna, mais feliz e mais respeitável, entre seus cidadãos.
De fato, este deveria ser o verdadeiro papel da escola e dos educadores: contribuir para uma vida melhor, mais saudável e respeitável, em todos os segmentos da sociedade, diante da radical pluralidade existente na vida de hoje: político, sociais, artísticos, religiosos ou científicos, pela ação continuada da epistemologia instrumentalizada da pedagogia, inter-relacionada com as demais ciências da educação, indissociáveis e contínuas, considerando o saber em toda sua extensão.
A educação assim repensada e compreendida desencadeia um processo refletido das relações entre a ética e agir pedagógico, através de uma prática educativa que interfira em nosso conhecimento, em nossas possibilidades, como aprendizes e investigadores, num misto de ação e aprendizagem.
Competência e Qualidade para Ensinar
Com o caráter reflexivo, do professor, deve-se estender a sua competência as ações de revisão sobre sua pratica, envolvendo não só trabalho criativo, autônomo, calcado, não apenas no conhecimento (métodos, conceitos e princípios), mas também nas capacidades de saber, saber fazer, saber como. Como isto, haverá um desenvolvimento da capacidade de aprender com sucesso e com os erros, no aprender com o outro, na troca de experiências, no aceitar responsabilidades, entre outras.
Perrenoud (2001:17) defende que “a abordagem por competências não pretende mais do que permitir a cada um, aprender a usar seus saberes para atuar”, criando, para o ensino de melhor qualidade, condições de formação que saiba, alem das palavras, decodificar sinais e símbolos do mundo e da cultura de sua época.
Em Alarcão (2001:23), “compreender o mundo, os outros e a si mesmo, bem como as interações entre estes vários componentes, sendo capaz ele de intervir, estabelecendo o alicerce para vivência e a cidadania”, posto que é através desta compreensão que nos tornamos preparados para o incerto, para o novo, para o difícil, para outras circunstâncias através de permanente “interação, contextualização e colaboração”, além da capacidade de aprender autonomamente, o que se tornou fundamental, em Educação; aliando-se a tudo isto, as competências de Perrenoud, como por exemplo: organizar e dirigir situações de aprendizagem, bem como administrar a própria formação contínua sabendo o como fazer: o que procurar, onde procurar, o que fazer com as múltiplas informações colhidas, para não se tornar num mero receptor ou reprodutor do saber acumulado ao mesmo tempo, recriando-as, distribuindo-as pelos múltiplos saberes, através de estratégias, também apropriadas, como: trabalhar a partir dos erros, a partir dos alunos, do seu próprio saber, desejando vencer obstáculos, estabelecendo relações entre o saber, a experiência e o trabalho, numa visão longitudinal dos objetivos, observando e avaliando as situações, valorizando as tecnologias e os dispositivos didáticos atualizados, disponíveis, interativos e flexibilizados, criando, intensificando e diversificando, o desejo de aprender e reforçando a decisão de aprender.
Para ensinar, então, é preciso, se ter esta conotação, reunir todas estas competências além de saber ouvir, observar, auxiliar, criar, inovar, de forma dinâmica, reflexiva, analítica e critica, consciente e responsável, cidadã e democrática.
O papel da Escola e dos professores na construção da democracia
Segundo Mello e Rego (2202; 4), a preparação e desempenho dos professores ligam-se a dois fatores básicos; “o novo perfil que a escola e os professores devem assumir para entender as demandas do mundo contemporâneo”, a questão tecnológica, os modelos de ensino, o desempenho docente e binômio eficiência e eficácia da instituição de ensino; outro fator preponderante é a expansão do numero de matrículas no ensino fundamental, “os avanços, no sentido de universalizar o acesso ao ensino obrigatório, transformam significativamente as expectativas educacionais”, fazendo professores elementos essenciais na realização da construção e atualização das escolas, no atendimento das necessidades de alunos com origens e interesses diversos, para quem a escola até então, não havia feito muito sentido, e para seus familiares, que até então eram excluídos ou não considerados.
Estes dois fatores têm gerado forte questionamento em torno da escola como pólo de ansiedades sociais e dos professores, na construção da democracia e, por isto mesmo, levado a todos os envolvidos em educação a debates, seminários, simpósios, fóruns, onde se valoriza a troca de experiências entre os profissionais e o conhecimento interativo e interdisciplinar.
A nova ótica escolar
Há, ainda, em relação a escola, uma exigência de que esta se pense por si própria, assuma-se como “escola reflexiva” e ofereça um trabalho muito mais profissional que o atual disponível. Isto desperta uma revisão da prática docente e a necessária e conseqüente reformulação da profissão docente que rompe com antigos conceitos do professor tradicional, acadêmico, enciclopedista, especialista, técnico com transmissão de conhecimentos prontos, acabados, com postura de ser “o dono da verdade”, com receitas e procedimentos de intervenções planejadas, numa forma mecanicista do ato de ensinar.
No novo contexto escola-sociedade todos crescem juntos: professor, escola, comunidade, com novos sistemas de trabalho, associando-se às escolas as idéias de núcleos, onde um conjunto de pessoas trabalham, não só desenvolvendo o professor, como novas aprendizagens do exercício da profissão docente.
Nesta era de mudanças criam-se muitas expectativas sobre o professor, e entre elas, contam-se: acolhedor da diversidade, aberto a inovações, comprometido com a aprendizagem, solicito aos alunos. Com sólida formação cientifica e cultural, com domínio da língua, com conhecimentos tecnológicos, articulador de conteúdos educacionais, interdiciplinar, com profundos conhecimentos de sua área de atuação, que estabeleça relações de integração da sua com outras áreas do conhecimento, implantador de projetos, alguém que valorize quem apreende, visando à melhoria da aprendizagem, do conhecimento, das habilidades e competências dos educandos.
Segundo Schön (1987), “a formação de professores tem recebido várias críticas mundiais por não produzir profissionais competentes que revertam a situação de desempenho medíocre “, conquistado pelas escolas, a altos custos e ainda, não reverter o quadro do desempenho dos alunos.
Para Rios (2001; 63), “o ensino competente é o ensino de qualidade”, o que apresenta a possibilidade de conexão entre as dimensões: técnicas, política, ética e estética da formação docente.
Finalizamos este artigo definindo um “professor competente” através de duas vertentes de qualidade: o caráter reflexivo da atividade docente e o caráter reflexivo do professor, como profissional e pesquisador.
Referências bibliográficas
ALARCÃO, Isabel. Professores Reflexivos em uma Escola Reflexiva. 2ª ed. São Paulo; Cortez, 2003.
DUTRA, Luiz Henrique de A. Epistemologia da Aprendizagem (O que você precisa saber sobre). Rio de Janeiro; DPZA Editora, 2000.
HERNANN, Nadja. Pluralidade e Ética em Educação. Rio de Janeiro; DPZA Editora, 2001.
IMBÉRNON, Francisco. Formação docente profissional: formar-se para a mudança e a incerteza. 4ª ed. São Paulo: Cortez, 2001.
MELLO, Guiomar Namo de & REGO, Teresa Cristina. Formação de Professores na América Latina e Caribe: A Busca por Inovação e Eficiência. Conferência Internacional: Desempenho de Professores na América Latina, Tempo de Novas Prioridades. Brasília; 2002.
PERRENOUD, Philippe. Dez novas competências para ensinar. Porto Alegre; Artes Médicas Sul, 2000.
RAMOS, Marise nogueira. A pedagogia das competências: autonomia ou adaptação? 2ª ed. São Paulo: Cortez, 2002.
RIOS, Terezinha Azeredo. Compreender e ensinar: por uma docência da melhor qualidade. São Paulo: Cortez, 2001.
SCHÖN, D. Educating the reflexive Practitioner. São Francisco; Jassey Bass, 1987.
* Mestra em educação e mestra em administração, professora da UNINOVE e UNICID.