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Provérbios Chineses e Valores Confucianos [1]
Ho Yeh Chia
FFLCH-USP
hochia@usp.br
Quem conhece um pouco da cultura oriental sabe que nela os provérbios têm uma importância fundamental. E no caso da cultura chinesa o uso dos provérbios na língua é quase obrigatório, ainda que seja numa conversa cotidiana ou num texto simples do dia-a-dia. Ao usá-los, o discurso se torna mais natural e espontaneamente chinês, o que faz com que seja mais agradável aos ouvidos de quem fala esta língua, já que os chineses incluem, de fato, provérbios nos seus pensamentos e raciocínios. Para os chineses, os provérbios são sentenças concisas e prontas que todos conhecem; e não há porque não usá-los já que são belos na forma e sábios na idéia.
Vale notar, antes de tudo, que há vários tipos de provérbios na língua chinesa. A diferença entre eles está na forma (erudita ou popular), nos uso dos termos (refinados ou não) e na origem (histórica, literária, etc.).
De maneira geral, os provérbios de forma mais refinada têm origem em passagens históricas ou literárias – procedem de pensadores consagrados ou de poemas famosos – e são eruditos, os chamados chéng-yü (que literalmente significa: expressões feitas). São, na sua grande maioria, formados por quatro ideogramas cuidadosamente escolhidos [2] .
Já os provérbios que usam termos mais simples, mais comuns, são muitas vezes de origem desconhecida (tradição oral), são os provérbios populares, os chamados sú-yü (que literalmente significa: expressões populares). Para estes, não há restrição de número de ideogramas.
As expressões consagradas, como se pode imaginar, são milenares. Entre os eruditos, saber citá-las corretamente no momento oportuno é uma forma muito agradável de manifestar conhecimentos, pois ser erudito, para os chineses, é, antes de tudo, conhecer a sabedoria dos antigos e poder citar, de cor, as sentenças consagradas.
No entanto, os provérbios populares também têm um valor inegável, pois como o analfabetismo sempre foi condição da maioria da população chinesa, e como esta conta com a tradição oral, nada mais natural que ela tenha desenvolvido, através dos provérbios populares, um saber de igual importância que os eruditos. E isto é tão verdadeiro que podemos encontrar, nos provérbios populares, sentenças que expressam idéias ou valores equivalentes às das expressões eruditas, só que numa formulação mais acessível e de mais fácil compreensão.
Nesse estudo, por uma questão de praticidade, vamos chamar ambos os tipos simplesmente de “provérbios”. Naturalmente, nas ocasiões onde se pede a diferenciação, faremos uma nota indicando se se trata de provérbio erudito ou popular. Mas, nosso objetivo aqui é levantar, nos provérbios (tanto eruditos quanto populares), manifestações de valores da tradição confuciana na cultura chinesa, tanto de forma espontânea (o caso dos provérbios populares) quanto intencional e sistemática (os eruditos).
Como já dizíamos, os chineses citam os provérbios para tudo, até mesmo para expressar votos de felicitação (na ocasião do aniversário, para boa viagem, votos de Ano Novo, inauguração de lojas, casamentos, etc.); ou para a mera descrição da natureza e das mudanças das estações do ano; como o eufemismo para referir-se a realidades negativas (como a morte, o ladrão, o homem mesquinho, etc); na descrição dos altos e baixos da vida humana; para animar as horas de adversidade e para aconselhar (à humildade, modéstia, prudência, cautela, etc) nas horas de sucesso; para elogiar os valores universais ou fundamentalmente chineses (de diversas vertentes como o confucionismo, o taoísmo, o budismo chinês, etc); e, é claro, para criticar bem humoradamente da falta de valores (a mesquinharia, a traição, a covardia, a ignorância, a hipocrisia, etc.).
Apresento , a seguir, alguns provérbios chineses, recolhidos por mim, para ilustrar algumas características da metáfora da língua chinesa, e também alguns dos valores fundamentalmente confucianos.
諺語: (provérbios)
Na cultura chinesa, incentiva-se que o homem imite as virtudes da natureza. Nos Analectos de Confúcio (séc. VI a. C.), o mestre dizia que aqueles que gostam de imitar as virtudes da montanha assemelham-se ao homem bom, e aqueles que gostam de imitar as virtudes da água aproximam-se do sábio (Analesctos, VI, 21). Ademais, os elementos da natureza são freqüentemente usados como metáforas de sabedoria. Ainda nos Analectos, Confúcio, já na velhice, disse que não deseja mais falar, pois os Céus não falam, mas as quatro estações continuam reciclando e os dez mil seres continuam nascendo (XVII, 19); e que os erros de um cavalheiro são como eclipse de lua ou de sol, não há como esconder-se, todos os enxergam; mas quando um cavalheiro corrige seus erros, é como o fim da eclipse, sua luz volta a ilumina a todos, e todos o admiram por isso (XIX, 21).
Naturalmente, o Céu e a Terra são as duas figuras de metáfora mais citadas nos provérbios chineses. As virtudes do Céu e da Terra que são encorajadas para a sua imitação são infinitas; basta observá-los bem e veremos que eles são os nossos modelos. Há um provérbio que diz: 天不語自高, 地不語自厚 “O Céu não se gaba de sua altura; a Terra não fica falando o quanto ela é espessa”.
E as plantas também ensinam muito: 桃李不言, 下自成蹊 “Nem a pessegueira, nem a ameixeira falam; mas debaixo delas, forma-se um caminho natural [por homens, ou animais, que são atraídos pela fragrância de seus frutos]”.
Assim, também temos muito a ganhar se observarmos os animais, que podem transmitir grandes sabedorias: 牛不知角彎, 馬不知臉長 “O boi não sabe que seu chifre é curvado; o cavalo não sabe que seu rosto é longo”. Este provérbio lembra a importância do auto-conhecimento: muito cuidado; antes de criticar os outros, devemos auto-analisar-nos para não dar vexame!
Como dizíamos, a natureza está também nos provérbios de felicitações:
No aniversário de idosos: o uso de elementos da natureza como símbolos de longividade, já que a vida humana é tão efêmera comparada à natureza, dizemos: 福如東海 壽比南山 [Que sua felicidade seja tão imensa] quanto o Mar do Leste, e [sua longividade tão infinita] quanto a do Monte do Sul.
Na viagem, contamos com a ajuda do vento, e dizemos: 帆風順 [Que] o vento [sopre] a seu favor.
一路順風 [Que você] siga a direção do vento até a chegada.
Ao fazer votos de futuros esplêndidos a jovens, usamos a metáfora do vôo dos grandes pássaros: 鵬程萬里 [Que seu futuro seja como] o vôo de dez mil kilômetros do grande pássaro Póng.
Ao fazer votos de sucesso eterno para um homem já realizado, usamos o sol e a lua: o rei e a rainha dos céus: 日月經天 江河行地 [Que seu sucesso seja tão duradouro como] o sol e a lua regendo nos Céus; [como] os rios e os lagos percorrendo na Terra.
Uma das situações da vida humana em que mais pede o uso dos provérbios é no momento de adversidade. Para este caso, temos um provérbio conhecidíssimo, extraído de um poema da Dinastia Sòng, do poeta Lù Yóu, que descreve os altos e baixos da vida humana com os elementos da natureza:
山重水复疑無路柳暗花明又一村 (宋, 陸游, 遊山西村)
(Montanhas e águas me cercam, penso que não há mais saídas; [depois de atravessar] as sombras do chorão, [encontro] os brilhos das flores, e [aparece], então, uma outra vila).
Normalmente citamos apenas 柳暗花明 (chorão, sombra; flores, brilhos), pois seu contexto é conhecido por todos. A idéia é bem esta: “depois da tempestade, vem a bonança”; ou “depois da escuridão, vem a luz”.
Animais:
O uso dos animais nos provérbios chineses também é notável. Os chineses personificam os animais e interpretam seus comportamentos segundo os valores humanos. Assim, alguns animais que são louvados, e outros, desprezados.
龍 Dragão:
O dragão é um animal lendário e muito admirado na cultura chinesa. Simbolizando a realeza (o imperador), o sucesso, a bravura, a sabedoria, a nobreza (espiritual), etc, o dragão foi usado num texto do filósofo (e escritor) taoísta Zhuangzi (séc. IV a. C.), onde se conta a passagem histórica (cuja veracidade histórica é duvidosa) da visita de Confúcio a Laozi.
Em seu livro “Tian Yün” (天運), Zhuangzi conta que Confúcio, aos cinqüenta e um anos de idade, visitou Laozi pela primeira vez e os dois conversaram. Chegando em casa, Confúcio ficou três dias sem pronunciar uma única palavra. Seus discípulos o perguntaram como foi a visita, e Confúcio lhes respondeu que finalmente viu um dragão! Pois “Laozi é como um dragão, tão fascinante que vôa nas nuvens, em perfeita harmonia com o universo, de forma tal que me deixou encantado a ponto de ficar de queixo caído, sem saber o que dizer”.
Ainda que esta passagem possa não ser verdadeira (não se sabe se Confúcio chegou a conhecer Laozi, ou até mesmo se os dois foram contemporâneos), o uso metafórico do dragão aqui, dá-se a notar o valor que se atribui à figura deste animal sagrado [3] . Ademais, os chineses, desde os tempos mais remotos, se auto-denominam de 龍的傳人 (“filhos de dragão”).
E também para os pais, todas as esperanças que depositam aos filhos se resumem na conhecidíssima expressão: 望子成龍 (“Que meu filho se torne um dragão”).
Ainda na figura do dragão, temos uma expressão para descrever grandes genialidades nas artes: 畫龍點睛 (“Ao pintar o dragão, pontuar suas pupilas”)
A pupila do dragão aqui representa o primor, o ponto máximo da genialidade de uma obra-prima. Este provérbio vem de um famoso conto: conta-se que um grande pintor de dragão uma vez pintou um belo dragão numa parede, mas o animal não tinha pupilas. Perguntaram para o pintor por que não pintou pupilas no dragão, e ele disse que se puser pupilas nesse dragão, o animal é capaz de ganhar a vida e sair voando para o céu, pois sem as pupilas ele já esbanjava brilho. Não acreditando nessas palavras, os espectadores insistiram para que colocasse as pupilas, e ao ganhar suas pupilas, o dragão pôde ver e saiu voando para o céu.
E, como seu oposto, temos o provérbio 畫蛇添足 (“Ao pintar a serpente, acrescentou as patas”). A cobra é, freqüentemente, metáfora de todos os tipos de maldade. Este provérbio também vem de um conto. Era um concurso de pintura de serpentes. Aquele que terminasse primeiro, ganharia uma jarra de vinho. O pintor que terminou antes de todos quis “esnobar” os outros, e resolveu acrescentar quatro patas na sua serpente. Enquanto pintava as patas, um segundo pintor terminou seu trabalho e bebeu o vinho. Inconformado, o primeiro reclamou o seu direito de ficar com o vinho, e lhe respondeu o segundo: “serpentes não têm patas. O que você pintou não é mais serpente, logo, já está fora do concurso!”. Assim, este provérbio é citado quando o tema do trabalho não condiz com o que foi pedido, ou quando alguém exagera tanto num assunto que a coisa deixou de ser ela mesma.
虎Tigre:
Outro animal muito admirado, e também temido, é o tigre. O tigre é freqüentemente colocado ao lado do dragão, ambos simbolizando pessoas de grande valor, talento e coragem.
Temos 臥虎藏龍 (“Tigre sentado; dragão escondido [que sem se moverem, passam despercebidos]”).
Este provérbio descreve o recolhimento intencional de pessoas muito talentosas, mas discretas. É usado para elogiar pessoas que não gostam de exibir suas qualidades.
Temos ainda 龍騰虎躍 (“O vôo do dragão; o salto do tigre”).
Não há nada mais espetacular do que o vôo do dragão e o salto do tigre! Este provérbio descreve talentos ímpares. Tão ímpares que “numa montanha não cabem dois tigres” 一山不容二虎: a idéia é a de que “a mesma cidade não comporta dois xerifes”.
E para a falta de talento, temos: 對牛彈琴 (“tocar harpa para um boi”). Boi é usado freqüentemente como a falta de capacidade de compreensão. Mas, é também símbolo de trabalhador fiel do homem: 汗牛充棟 (“fazer suar um boi”) é um provérbio usado para descrever a riqueza de uma biblioteca, onde possui tantos livros que é de fazer suar um boi de tanto carregar.
Os órgãos do corpo humano:
Os órgãos humanos (tais como: o fígado, a vesícula, a barriga, o peito, o sangue, o coração etc.) também estão muito presentes nos provérbios chineses, e não querem dizer apenas órgãos humanos puro e simplesmente, mas representam valores preciosos.
A generosidade:
A generosidade é representada pela barriga, pelo ventre. Dizemos:
宰相肚裡能撐船 “Na barriga de um Primeiro Ministro cabe um barco”.
Naturalmente, o Primeiro Ministro, aqui, representa um homem de grande valor e de grandes feitos, um cavalheiro de espírito nobre, cuja barriga suporta um barco (de ofensas, mesquinharias, etc.); é quem a tudo perdoa.
Dizemos também: 君子之腹 (a “barriga de um Junzi” [cavalheiro, homem nobre]), que foi tirado do 以己度人: 以小人之心 度君子之腹.
Note-se que é a barriga que deve suportar tudo; assim, o que mede a generosidade de um homem é o tamanho da barriga. Nas peças de ópera chinesa, faz parte do figurino do Primeiro Ministro usar uma barriga grande.
A fidelidade e a lealdade:
A fidelidade e a lealdade (忠信) são representadas pelo fígado, pela vesícula, pelo tronco e pelos ossos.
赤膽忠心 肝膽相照 披肝濿膽 粉身碎骨
Já a sinceridade é representada pelo coração: 赤子之心
A integridade:
A idéia da integridade nos provérbios chineses está sempre ligada à da morte, ainda que em alguns casos fazem o uso de outros elementos, como a apreciada pedra jade. A integridade é tratada nas situações onde há a falta dela: 寧為玉碎 不為瓦全 “Prefiro ser jade, ainda que despedaçado, do que um tijolo, ainda que intacto”). O provérbio expressa a idéia de que a integridade espiritual é superior à integridade física.
Temos ainda: 不自由 毋寧死 “Não podendo ser livre, prefiro a morte”.
e: 成仁取義 “[Se for preciso], morro para obter a justiça”.
A tradição de preferir a integridade espiritual à vida é muito antiga, encontra-se desenvolvida pelo grande filósofo confuciano, Mêncio (séc. III a. C.): “Disse Mêncio: ‘Gosto do peixe, mas gosto também da palma de urso [4] . Entretanto, se não puder ficar com os dois, prefiro ter a palma de urso. A minha vida é preciosa, a virtude também é preciosa. Entretanto, se não puder ficar com os dois, prefiro a morte do que perder a virtude.” (Livro VI-A, cap. 10). Para Mêncio, a vida humana é tudo que temos, entretanto, ela não terá nenhum valor se não for vivida com virtude.
O humanismo confuciano e o voltar-se para si: Não podemos falar dos valores confucianos sem citar a virtude Rén (仁), centro do humanismo confuciano, pois este conceito trata diretamente do homem, do ser humano, sem usar metáforas.
O próprio ideograma 仁 significa: dois homens. Assim, não só tudo que envolve o Eu e o Outro é seu tema (como amar, como ser benevolente, como devem ser as relações interpessoais, como se comportar diante dos deveres e dos direitos, como lidar com os sentimentos, etc), mas trata principalmente do “si mesmo”. O ideograma 仁 “dois homens” sugere a idéia de extrair as qualidades humanas no ser humano, da realização daquilo que é da excelência do ser humano, da areté do homem, do cuidado de si mesmo, de ocupar-se em si mesmo, de descobrir a essência humana; enfim, do “ser verdadeiramente homem”.
Em resumo, o humanismo confuciano indaga sobre “como ser homem”. Mas, para que saibamos “como ser”, devemos saber antes de tudo “quem somos”. Assim, disse Confúcio: “Que o Príncipe seja Príncipe; o súdito, súdito; o pai, pai; o filho, filho” 君君臣臣父父子子 (Analectos, 12: 11). A idéia é de que “cada um deve fazer a sua parte, fazer o que lhe compete”.
É também o que sugere a famosa formulação chinesa: 自知之明: “A sabedoria de conhecer-se a si mesmo”. O auto-conhecimento não serve só para que possamos saber “o que fazer”, e “como fazer”, mas é essencial para que possamos nos situar na realidade, e então livrarmo-nos da super-estimação ilusória e decepcionante, e da sub-estimação injusta (tanto sobre nós mesmos, quanto sobre os outros).
Para este tema, temos os conhecidíssimos provérbios: 以己度人: “Eu interpreto os outros a partir de mim mesmo”. A idéia corresponde ao provérbio espanhol: “Cree el ladrón que todos son de su condición”.
E, 以小人之心 度君子之腹 “Um homem mesquinho interpreta o comportamento de um Junzi [cavalheiro] a partir de suas próprias intenções”, pois é certo que:
仁者見仁, 智者見智
“Um homem que cultiva a virtude Rén sabe reconhecê-la quando ela aparece no outro; e um homem de grande sabedoria sabe reconhecer um outro sábio quando está diante dele”. E pela mesma lógica, um 小人 (homem sem valor), não reconhece nenhum valor (já que ele mesmo não o possui), e interpreta tudo segundo suas abomináveis limitações.
Nesse sentido, a melhor forma de realizar a Rén é questionar a si mesmo, buscar o estar de bem consigo mesmo, e não tardar a corrigir os erros que encontrar em si próprio.
Educação:
A educação, como sabem, é um valor essencialmente confuciano. Para Confúcio, um homem que não é educado (tanto no sentido de cultivo de valores quanto no de saberes) não é nada. O mestre usava a figura da pedra jade trabalhada para compará-la a um homem educado: 玉不琢不成器 “Um jade que não é lapidado, não serve para nada” [assim como um homem que não foi educado, para nada contribui]
切磋琢磨 E o processo da educação é “cortar, esculpir, talhar, polir”, como o que fazemos com o jade. Portanto, é preciso que os mestres conheçam bem cada um dos seus discípulos, para que desenvolvam, em cada um deles, os saberes que mais lhes são apropriados, assim como é importante conhecer cada peça de jade (a densidade, a dureza, o tamanho, a cor, etc.) para poder decidir o que fazer dela (um vaso ritual, um cálice, um colar, uma pulseira, etc.), lapidar do melhor modo para aproveitar o máximo de cada peça.
Mas, temos também muitos provérbios que tratam da educação comparando-a com a natureza: 春風風人 “O vento da primavera que sopra suavemente nos homens”: o saber é tão delicioso como a brisa.
春風化雨 “A chuva e o vento da primavera” são duas coisas essenciais para que as plantas nasçam e cresçam, assim como a educação é para o desenvolvimento humano.
逆水行舟 “O barco que rema contra o maré”: o processo educativo, desde os tempos mais remotos, é algo como que remar contra as tendências da sociedade.
近朱者赤近墨者黑 “Quem se aproxima do rubro, vermelho ficará; quem se aproxima do nanquim, preto estará”: um provérbio que adverte a escolha cuidadosa dos amigos, pois, não há influência maior do que a dos amigos.
Entretanto, 上梁不正下梁歪 “Se a viga de cima estiver torta, não há como endireitar a de baixo”: o provérbio que lembra a importância do bom exemplo dos superiores (pais, governantes, professores, etc.), pois quando se trata de educar para virtudes, só se ensina fazendo.
E por fim, para agradecer a presença de todos que estão aqui reunidos, quero citar dois provérbios que mostram o valor que os chineses dão aos encontros humanos:
十年修得同船渡, 百年修得共枕眠
“É preciso ter cultivado durante dez anos para que as pessoas possam atravessar [um rio, um lago, um oceano] no mesmo barco; e é preciso ter cultivado por cem anos para que duas pessoas possam se tornar marido e mulher”. Acreditamos que é preciso ter cultivado, de alguma forma, em algum tempo e espaço, para que o encontro se realize. Assim, todos os encontros tomam um sentido maior do que meras coincidências, e, como conseqüência, somos gratos a todos que cruzam nossas vidas, ainda que seja só para atravessar o rio juntos.
E:
久旱逢甘雨 他鄉遇故知
“Como a chuva é esperada por longa estiagem, um amigo é esperado numa terra estrangeira”. Não há alegria maior do que encontrar um amigo fora da terra-natal.
Muito obrigada!
[1] Este artigo recolhe a conferência de mesmo título da autora no seminário: “Provérbios e Tradições Orientais”, realizado na FFLCH-USP, em dezembro de 2002. Preservamos o tom coloquial da conferência.
[2] Por terem origens históricas ou literárias, entre as expressões eruditas, há aqueles cujas idéias podem ser entendidas claramente ao lê-los (por ex.: 自知之明“a sabedoria de conhecer-se a si mesmo” ); e há outros que são impossíveis de serem entendidos caso desconhecermos seu contexto histórico, seu autor, ou os poemas donde foram tirados. Por ex.: 梁上君子 “o senhor da viga” (que quer dizer apenas “ladrão”.) Em português, temos também expressões como: “o calcanhar de Aquiles”, por ex., que desconhecendo seu contexto, não se compreende seu sentido.
[3] A saber, os quatros animais sagrados na China são: o unicórnio 麟, a fênix 鳳, a tartaruga 龜, e o dragão 龍. Como podem ver, dos quatro, só a tartaruga não é um animal lendário.
[4] Palma de urso é um prato raro que, além de ser muito apreciado, simboliza o status social elevado, consumido apenas por nobreza. Já peixe aqui é metáfora do trivial, comum.